Os parlamentares lotaram o plenário, os empresários encheram as galerias, inaugurando uma prática tradicional dos trabalhadores, que, dividindo o espaço com os patrões, ocuparam ainda o salão verde da Câmara para acompanharem, na manhã desta terça-feira (25), o debate sobre a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais.
O ministro do Trabalho, Carlos Luppi, o primeiro a falar, fez a defesa da proposta, lembrando que em 1988, quando a Constituição reduziu de 48 para 44 a carga semanal de trabalho, os patrões utilizaram a mesma argumentação que apresentaram hoje, com ameaças de falências e desemprego e nada disso ocorreu.
O deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da Força Sindical, ironizou que eles estão com adesivo defendendo as 44 que tanto combateram em 1988. O empresariado ostentou nas lapelas o adesivo com as palavras "44 é mais emprego". O parlamentar disse ainda que de todas as queixas que os empresários fazem da vida das empresas nunca houve crítica à jornada de trabalho.
O ministro Luppi citou o exemplo de vários países em que a média da jornada de trabalho é inferior a 40 horas semanais e que estão se desenvolvendo economicamente, como a China e a Índia, além de países da Europa.
Ao final da fala do ministro, os trabalhadores se manifestaram com aplausos e palavras de ordem: “40 horas já”. O presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), disse que as manifestações deviam ocorrer a cada 10 oradores e ameaçou suspender a sessão em caso de manifestações negativas, como as vaias que os trabalhadores lançaram para o segundo orador, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o deputado Armando Monteiro (PTB-PE).
Monteiro tentou responder ao ministro, dizendo que os países que concorrem com o Brasil tem jornadas mais altas e que no Brasil a média da jornada já é inferior a 44 horas. E insistiu com a proposta de que a redução ocorra pela negociação, setor a setor. Segundo ele, a lei nivela situações distintas e se revela inadequada.
A proposta que está pronta para ser votada em plenário, de autoria do então deputado e hoje senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), reduz a carga de trabalho das atuais 44 para 40 horas semanais, com manutenção do salário. E eleva de 50% para 75% o adicional a ser pago pela hora extra.
Os 30 oradores inscritos se revezaram no microfone, durante quase quatro horas de debate, em alegações a favor e contra a proposta. As centrais sindicais escalaram suas lideranças para defenderem a proposta, enquanto os empresários apresentaram líderes de vários setores econômicos para convencer os parlamentares de votarem contra a proposta.
Momento de votarO deputado e líder sindical Paulinho da Força apresentou um requerimento, assinado pelos líderes de vários partidos, a exceção do líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), pedindo ao Presidente da Casa a preferência de votação para a matéria. Ele disse que a proximidade das eleições é o momento oportuno para votação da proposta para que os parlamentares demonstrem, “se fica com quem paga a eleição ou com quem vota.”
O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Wagner Gomes, disse que falaria principalmente aos empresários, lembrando-os de que na constituição de 1988 foi usado o mesmo argumento que as empresas usam hoje de que elas quebrariam se fosse reduzida a jornada de trabalho. Dirigindo-se aos empresários, o líder sindical perguntou: “quebraram ou aumentaram os seus lucros?”
Quando houve o debate do reajuste do salário mínimo, os empresários diziam que se aumentasse o salário mínimo acima da inflação, as empresas não aguentariam, o que aconteceu foi que aumentou o consumo e conseguentemente o lucro das empresas.
Responsabilidade de todosGomes fez nova pergunta, desta vez dirigida a todo o povo brasileiro, para se contrapor à alegação de que a medida vai aumentar em 1,9% o preço final da mercadoria: ‘É melhor isso ou viver com trabalhadores desempregados?” acrescentando que “um exército de desempregados não beneficia o país.”
Ele disse ainda que não existe interesse dos trabalhadores de acabar com as empresas. “Nós temos responsabilidades”, ressaltou, cobrando dos empresariados a mesma responsabilidade de abrir vagas de trabalho, o que permitiria a criação de 2,5 milhões de empregos.
Sabe quem ganhará dinheiro com o crescimento da economia? Evidentemente que os empresários. Vocês têm razão ao dizer que o nosso País tem de dar prioridade ao desenvolvimento da indústria nacional, tem de dar prioridade à pequena e média empresa, que geram o dinheiro. Agora, tem de dar prioridade também ao povo brasileiro, para que tenha um padrão de vida digno para poder sobreviver”, concluiu.
Trabalhador escravo
O presidente do União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, usou sua fala para destacar a situação dos comerciários, a categoria que mais se beneficiará com a redução da jornada de trabalho. Ele admite que muitas categorias já trabalham menos que 44 horas, algumas até menos que 40 horas, mas o comerciário trabalha 54 horas por semana.
As mulheres, que são maioria no comércio, trabalham 54 horas por semana e cuidam da família, disse o líder sindical, para quem é preciso ver a realidade do país. Para ele, hoje no Brasil existem trabalhadores de primeira e de segunda categoria. Essa divisão se deve principalmente ao governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, quando os empresários conseguiram, por força de lei, colocar o comerciário para trabalhar domingos e feriados. “Fizeram do comerciário um trabalhador escravo”, enfatizou.
Ele, a exemplo dos outros oradores representantes dos trabalhadores, rejeitou a proposta dos empresários de negociar, setor a setor, a redução da carga de trabalho, lembrando que “naquele momento, os empresários não queriam negociar; queriam uma lei que transformasse o comerciário em escravo.”
De Brasília
Márcia Xavier